A lista de argumentos contra o casamento gay e lésbico élonga.

Mas é algo que ressurge regularmente em tribunas muitosérios: seria uma reforma paradoxal e anacrônica. Por que oshomossexuais reivindicam essa instituição conformista evelhusca que é o casamento, interrogam-se seus adversários?
Esse discurso é hábil, sob dois aspectos: evita o riscohomofóbico e principalmente inverte os papéis. Os modernosnão são aqueles que pedem o casamento "homo", mas aqueles queo contestam pelo fato de que não está na moda. O casamentogay e lésbico seria ultrapassado antes de ter existido. Esseraciocínio também tem a vantagem de ser compreensível a todos.
Na verdade, esse discurso contém um preconceito: a culturahomossexual seria sinônimo de uma certa liberdade sexual e deuma vida amorosa atípica. A vida homossexual seria marginal,ou não seria. Reivindicar o casamento seria quase "contra anatureza". No final dos anos 90, o pacto civil desolidariedade (pacs) já havia provocado críticas, digamossimplistas, e que beiram o comunitarismo.
Mas essas propostas significam colocar os casais homossexuaisem caixas, lhes pregar uma etiqueta. É negar uma outrarealidade: a de casais que vivem juntos há dez, 15, 25anos... Nesse debate, alguns fingem não perceber que a vidade casais homossexuais é tão plural quanto a dos "heteros".
Partindo daí, compreendemos melhor a motivação do casamentogay e lésbico: é a igualdade dos direitos dos casais, sejaqual for sua orientação sexual. Estender o casamento aos gayse às lésbicas é lhes oferecer um leque tão amplo quanto o queé dado aos heterossexuais: o direito de se casar ou não, defazer o pacto ou não, de viver em união livre, etc.
Essa óptica da livre opção poderia seduzir uma parte dadireita. Teria sido preciso pegar pela palavra NicolasSarkozy (então prefeito de Neuilly pelo Partido Republicano),quando ele disse, dois anos depois do pacs: "As pessoas viramo pacto como uma opção, incluindo a de não assinar um.. Apalavra 'opção' é mais moderna que 'liberdade'", antes de constatar que "apesar do pacs houve muitos casamentos em2000".
Que o deploremos ou não, o casamento continua sendo umareferência: é a forma de união mais completa no planojurídico. Portanto, não é de surpreender que os excluídosdele o reivindiquem. O casamento gay e lésbico corresponde aessa necessidade de reconhecimento e de igualdade. É umaforma de combate às discriminações.
Em vez de se concentrar no casamento "homo", seria melhortrabalhar para preencher o vazio jurídico da união livre,replicam os adversários. Mas não existe qualquer iniciativaconcreta até hoje que vise tornar igualitários os diferentestipos de vida conjugal. Se a polêmica sobre o casamento gaypermite retomar essa interessante questão, só podemos nosfelicitar...
Alguns também crêem saber que poucos homossexuais queremrealmente se casar. Seria o capricho de uma minoria. E daí?Desde quando em uma democracia medimos o bem-fundado de umareforma por seu impacto numérico? Por essa conta, ninguémlevantaria o dedo mínimo pelos sem-papéis.
Direita irritada
Casamento homossexual? A direita se esquivou do debatesalientando que havia outros combates a travar. De repenteela redescobriu a importância da luta contra a homofobia comoum aperfeiçoamento do pacs... Duas promessas de JacquesChirac, feitas em 2002, e que ainda não foram honradas. O ministro da Justiça, Dominique Perben, anunciou um projeto delei que visa o combate à homofobia, mas nada garante que umvoto em primeira instância ocorra antes do fim da sessãoparlamentar.
Na verdade, à direita, a polêmica sobre o casamentohomossexual irrita porque salienta a inação do governo sobrequestões sexuais, há dois anos, a algumas poucas medidas - acircunstância agravante em caso de assassinato, tortura,violência, estupro ou agressão sexual motivados pelahomofobia. Seus dirigentes baixam a cabeça, como à espera deque o temporal passe.
Uma tal reforma, com a ajuda da perturbação da direita,poderia ter unido a esquerda, em busca de projetos que visamreduzir as desigualdades. Mas vimos a que ponto esse dossiê a mergulha na perplexidade. Alguns promotores do pacs sãohostis, como se temessem que o nascimento do casamentohomossexual indique a morte do pacto civil de solidariedade.
Outros apoiaram imediatamente a reforma, como Jack Lang (PS),Christophe Girard (Verdes), seguidos por Dominique Strauss-Kahn (PS), enquanto Noël Mamère (Verdes) virou notícia aocelebrar um casamento gay em sua prefeitura de Bègles noúltimo dia 5.
Se o primeiro-secretário do Partido Socialista, FrançoisHollande, acabou apresentando uma proposta de lei favorávelao casamento homossexual, o debate está longe de decidido.Lionel Jospin estragou a festa ao escrever, em uma tribunapublicada por "Le Journal du Dimanche" em 16 de maio, que ocasamento é "a união de um homem e uma mulher" e "remete àdualidade dos sexos que caracteriza nossa existência e que éa condição da procriação", na linha direta das teses de suaesposa, a filósofa Sylviane Agacinski.
A todos os socialistas assustados pelo casamento homossexual,o ex-primeiro-ministro deu sua bênção: "Podemos reprovar ecombater a homofobia, ao mesmo tempo não sendo favoráveis aocasamento homossexual, como é meu caso", salientou.
Esvaziando o debate
A filiação e a adoção por casais homossexuais estão no centrodo debate. Mas seria preciso que este ocorresse. O tema foievacuado dos debates parlamentares sobre o pacs, que ogoverno desejava a todo custo desconectar da família. Hojenão podemos mais fazer essa economia.
Poderíamos nos perguntar o que significa a imagem do pai e damãe no século 21. A identificação com os dois sexos deve seresumir ao universo familiar, como se a criança não fosseaberta ao exterior (escola, família no sentido mais amplo,etc.)?
Na verdade, milhares de crianças são criadas por pais domesmo sexo. Outras crescem em famílias monoparentais ourecompostas. Temos vontade de ouvir essa discussão noParlamento. Ela apresentaria o interesse de confrontar osargumentos teóricos com a realidade social. Finalmente.

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